Teach For Portugal

Conheci o Mateus (nome fictício) em novembro. Um aluno que me chamou a atenção por estar sempre cabisbaixo, sossegado e sem intervir muito.

Ao longo do 1.º período ia sempre ao lugar dele perguntar se estava bem e a resposta era sempre “estou bem!”. Poucas foram as vezes que o Mateus me chamou ao lugar para pedir ajuda.

Na última semana de aulas do 1.º período, realizei uma dinâmica denominada “Elogios de Natal”. Com a chegada da época natalícia era uma ótima oportunidade de trabalhar os elogios. Realizei um “amigo secreto” em cada turma, pedindo-lhes para escreverem, no mínimo, um elogio e uma mensagem de Natal ao colega. Na turma do Mateus fizemos esta dinâmica no último dia de aulas antes das férias de Natal e, devido a alguns confinamentos profiláticos, sugeri escrevermos todos uma mensagem numa folha A3.

Durante a atividade, o Mateus começou a incomodar os colegas que ainda estavam a escrever: ora lançava canetas, ora começava a bater nos colegas. Pedi-lhe algumas vezes para parar, sem efeito. Perguntei-lhe se podia vir falar comigo fora da sala, mas respondeu-me de punhos cerrados que não. Decidi não insistir, mas não desisti. Voltei ao lugar dele e pedi-lhe “Mateus, só quero falar contigo. Dás-me 1 minuto do teu tempo?”. Após várias tentativas, ele concordou.

Cá fora, sentei-me ao seu lado. Perguntei-lhe como estava, o que tinha sido o almoço, tentei quebrar o gelo. Consegui que falasse comigo, o que para mim já era uma vitória visto que só respondia “sim” ou “não”. Senti que estava na hora de avançar com a pergunta pela qual me fez insistir em querer falar com ele:

Raquel: “Mateus, porque é que hoje atiraste coisas e destes murros aos teus colegas?”

Mateus: “Era a brincar Raquel. Eu sou muito brincalhão fora da sala… e senti-me mais à vontade hoje.”

Raquel: “Fico feliz por te sentires mais livre nas aulas, mas há formas de brincar sem usar violência. O que é que a professora está sempre a dizer-vos?”

Mateus: “Violência origina violência.”

Raquel: “Ora nem mais. Quando sentires que vais ser mais bruto com os teus colegas sabes que podes pedir para sair para respirar fundo, não sabes? Ou pedir-me ajuda. Eu estou aqui! Vou estar sempre aqui para ti porque eu acredito em ti e na grande pessoa que vais ser!”.

 

O Mateus começou a chorar e abraçou-me… naquele momento percebi que possivelmente foi a primeira vez que ele ouviu alguém dizer-lhe que ele era importante e que acreditava no potencial dele. Por dentro, eu também estava a chorar com ele.

 

O 2.º período iniciou e o Mateus começou a chamar-me mais vezes ao lugar para colocar as suas dúvidas. Numa aula de Educação Tecnológica informei os alunos que iriam ser eles a dar a aula e dividi-os (de acordo com as regras de higienização) em dois grupos para trabalharem temas distintos.

No grupo em que o Mateus ficou, reparei que ele não estava a ter muito protagonismo e perguntei: “Malta, vamos pôr aqui o Mateus a apresentar o vosso trabalho também?” todos concordaram menos o Mateus. Eu insisti: “Mateus, anda lá, nem que seja só dizeres o tema que vão falar, pode ser? Eu acredito em ti, tu também tens de acreditar que consegues!”, e ele cedeu.

Chegou a altura da apresentação. E quando o grupo foi questionado sobre o que era “transformação do movimento” o Mateus assumiu o papel de líder e respondeu-me a tudo, desde a definição do tema a exemplos do mesmo. No fim da aula perguntei-lhe:

“O que aprendeste hoje Mateus?”, à qual ele respondeu:

“Aprendi que eu também acredito em mim!”.

Como o Mateus, há imensos alunos que precisam de acreditar neles, que podem ser tudo aquilo que eles quiserem ser, e fazer coisas incríveis nesta caminhada que é a vida!

Autora: Raquel Montenegro – mentora no 1.º ano do Programa de Desenvolvimento de Liderança