“Hoje, conto-vos a história do Salvador (nome fictício).
O Salvador é um aluno que já acompanho há algum tempo. Doce, frágil com capa de super-herói e dono de uma insegurança que vai tentando camuflar com reações impulsivas, para ele, integradoras… À parte disso, o Salvador adora aprender e mostrar que qualquer desafio, para ele, é canja. Ele é capaz e tem um potencial enorme.
Estávamos na aula de Português, onde foi pedido aos alunos que apresentassem o anúncio publicitário que anteriormente haviam feito. O Salvador, quando chegou a sua vez, mostrou-se ansioso, mas foi. Chegado à frente, assumiu uma postura defensiva. Leu o mais depressa possível, num tom meio jocoso, e não olhou para a turma. No final, a professora sugeriu-lhe algumas dicas para tentar novamente. O Salvador, que detesta, palavras dele, ‘ser corrigido’, revirou os olhos, bufou para o lado e ainda meio que soltou um palavrão. Ainda assim, a professora não desistiu dele e três tentativas depois, o Salvador apresentou o seu trabalho, com distinção. Mas, ainda com a vergonha de ter sido corrigido, passou um bom bocado da aula a colocar defeitos a todas as apresentações dos colegas. Quando me apercebi, larguei tudo e pedi-lhe para irmos lá fora.
Já cá fora, conversámos sobre a necessidade de controlarmos os nossos impulsos, de conhecermos as nossas emoções, o que as despoletam e como reagimos, e de aceitarmos sugestões para continuarmos a nossa aprendizagem. Depois, partilhámos histórias, trocámos confidências e, no final, disse-lhe: ‘quando estiveres enervado e antes de perderes a cabeça, podes, por exemplo, inspirar, contar até 10 e depois expirar, repetindo o processo.’ Ao que ele me respondeu: ‘eu não gosto do número 10’ e eu perguntei: ‘qual é o teu número preferido?’ ‘É o 9’, respondeu-me entusiasmado. ‘Então trocas o 10 pelo 9, o que te parece?’. Apertámos as mãos, em jeito de compromisso. Mas confesso que não tive fé neste acordo. Até que…
Voltámos para a aula. O Salvador estava, claramente, mais calmo e motivado. O seu colega de mesa, pelo contrário, estava nervoso com a sua apresentação. Tremia e parecia assoberbado. Eu não me apercebi. Mas, mais tarde, o Salvador chamou-me e, quando cheguei junto dele, disse-me, com os olhos mais doces que já lhe vi: ‘Patrícia, o Paulo estava nervoso, mas acho que o consegui ajudar… Disse-lhe para respirar fundo, inspirar, contar até ao seu número preferido e expirar’.
Olhei para ele, com ternura, e disse-lhe ‘obrigada’!”
Autora: Patrícia Vinhais
– Mentora no 2º ano do Programa de Desenvolvimento de Liderança