Com os alunos no centro, a educação assume novos significados. A sala de aula transforma-se num espaço para moldarem quem são e como se relacionam com o mundo à sua volta.
Numa altura marcada por conflitos e crises que afetam as nossas comunidades, a escola torna-se ainda mais essencial na formação de cidadãos capazes de construir uma sociedade mais empática e solidária.
A escola é, e deve ser, o espaço onde se promovem competências como a empatia, a comunicação e a colaboração, tão essenciais como as aprendizagens académicas. Durante a minha experiência na Academia Teach For Portugal, testemunhei de perto como essas competências podem ser cultivadas nos alunos.
A Academia Teach For Portugal, em pleno verão, trouxe-me o desafio de trabalhar com alunos de 14 e 15 anos. Claro que a perspetiva de passar parte das férias em sessões de apoio a Inglês, Matemática e Português não tinha sido a mais animadora para os alunos do 3º ciclo. Para nós, Mentores Teach For Portugal, era a oportunidade de finalmente pôr em prática as cinco semanas de formação teórica. No fundo, a Academia Teach For Portugal é a formação inicial teórica e prática, que nos prepara para uma missão maior: a partir de setembro, começar a trabalhar nas escolas mais desfavorecidas do país.
Com a visão de que para serem cidadãos ativos e comprometidos, os alunos devem ter oportunidades de participação em sala de aula, pusemos mãos à obra.
Numa sessão sobre festividades ao redor do mundo, encenaram teatros e viajaram do Carnaval do Brasil até ao Ramadão do Paquistão. Interpretando cenas de todo o mundo com os colegas, ao mesmo tempo que refletiram sobre outros contextos e realidades, trabalharam a comunicação e colaboraram entre si. Os alunos que diziam convictamente não falar inglês, aulas mais tarde, com o apoio dos colegas, atuaram nos seus papéis inteiramente em Inglês.
Depois de duas semanas juntos, estavam mais envolvidos, participavam nas discussões e debates e até traziam as suas próprias ideias. Claro, nem tudo correu bem. Houve sessões que, planeadas com grande expectativa, falharam por completo. No entanto, foram justamente essas experiências que me proporcionaram as maiores aprendizagens. Tinha conseguido trabalhar várias competências nos alunos, alinhados ao PASEO (Perfil do Aluno à Saída da Escolaridade Obrigatória), sempre tendo em conta o principal objetivo: ver o aluno como o seu próprio líder, capaz de atingir o máximo potencial.
No entanto, chegados à última semana, com os alunos mais à vontade, surgiram problemas de gestão de comportamento: falavam por cima uns dos outros e começaram a fazer comentários desagradáveis dos colegas. A poucos dias do final da Academia, o que inicialmente foi um problema de comportamentos em sala de aula acabou por se transformar na oportunidade de “co-construir” com os alunos uma sala de aula que cultiva o respeito, a empatia e a colaboração.
Decidimos, em equipa, que queríamos passar uma mensagem de rigor à turma. Porque acreditamos que a cultura que vivemos na sala aula tem impacto na maneira como os alunos interagem com o mundo à sua volta, queríamos que reconhecem a importância do respeito pelo outro, de empatia e cuidado mútuo e que os alunos construíssem relações positivas e empoderadoras entre si. No fundo, o que queríamos realçar é de que é nestes valores que está a chave para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva.
Assim, riscámos os exercícios sobre o past simple e o future e optámos por um caminho diferente: focarmo-nos em gerir os comportamentos e construir uma visão para a sala de aula. Percebemos rapidamente que esta visão tinha de ser co-construída com os alunos. Que sentido faria dizer a adolescentes de que tinham de se respeitar uns aos outros sem primeiro ouvir o que tinham a dizer e sem permitir que partilhassem eles as suas visões, sentimentos e como viam que podiam fazer a diferença?
Por isso, num primeiro momento, organizámos uma assembleia de turma. Recordámos os acordos feitos na primeira semana sobre a criação de um espaço seguro para todos e sugerimos que fossem reavaliados. Como era de esperar, no início, todos falavam ao mesmo tempo. Inspirados pela teoria dos “Seis Chapéus do Pensamento” de Edward de Bono, introduzimos uma dinâmica diferente.
Colocámos três objetos na sala: uma caneta para dar uma ideia, uns óculos de sol para uma objeção, e um coração de papel para expressar um sentimento. Apenas com um destes objetos na mão poderiam intervir na discussão.
Sentados em roda, na sala de aula, e com estes objetos à sua frente, os alunos da Turma 8 reconheceram os seus problemas e delimitaram soluções que podiam tomar para os contornar.
- Com o coração de papel na mão, alguns alunos admitiram sentir que não eram ouvidos e, por isso, decidiram que deviam incentivar a participação de todos os colegas e respeitar o tempo de fala de cada um;
- Reconheceram o desrespeito entre colegas e comprometeram-se a ser mais cuidadosos na sua comunicação, usando uma linguagem apropriada;
- Por fim, com o poder da caneta, prometeram cuidar uns dos outros.
Não vou dizer que, depois dessa sessão, todos os problemas desapareceram como por magia na Turma 8. Contudo, ao ouvirem as inquietações uns dos outros, a turma construiu uma verdade partilhada. Mais conscientes, traçaram um caminho que desejavam seguir juntos — e, quem sabe, levam consigo valores que os acompanhe nas salas de aula do próximo ano letivo. Eu sei que certamente os levo comigo.
Levo a convicção de que é na escola que reside a oportunidade de preparar jovens para pensar de forma crítica, comunicar clara e concretamente as suas ideias e perspectivas e, assim, desenvolverem a capacidade de intervir ativamente na sociedade.
É aqui que acredito estar o primeiro passo para que um dia, através da educação, todas as crianças em Portugal se sintam empoderadas, como indivíduos e cidadãos, para transformar a sua realidade e a do mundo à sua volta.
Esta é a visão da Teach For Portugal, uma organização sem fins lucrativos que tem como objetivo que todas as crianças tenham acesso a uma educação que lhes permita desenvolver o seu máximo potencial, independentemente do seu contexto socioeconómico.
Para isso, recruta e forma profissionais de várias áreas para trabalharem a tempo inteiro como Mentores Teach For Portugal durante 2 anos nas escolas que servem os contextos mais desfavorecidos do país.
Neste novo ano letivo, são 119 os Mentores Teach For Portugal que vão colaborar com professores de várias disciplinas em sala de aula e em projetos envolvendo a comunidade, com o objetivo de desenvolverem nos alunos as competências e os resultados académicos chave para mudarem o futuro provável das suas vidas.